Aceleramos o HB, futuro nacional da Hyundai.
Primeira volta antecipa: vem aí um novo padrão de hatch compacto.
Hyundai só permitiu fotos com os carros camuflados, mas porte do hatch é similar ao de Gol e PalioDirigir um protótipo quase um ano antes do lançamento oficial do carro é uma oportunidade rara. Em 11 anos de carreira, essa foi a primeira vez que recebi tal convite. Mas tinha gente ali mais ansiosa que eu naquela tarde fria de outono no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Hyundai, na Coreia do Sul. Eram os engenheiros do projeto HB, aboletados no banco de trás do hatch, enquanto eu assumia o volante. Era como se o trabalho deles nos últimos três anos caísse por terra diante de alguma crítica da minha parte. Saio devagar, mas logo me sinto em “casa” e piso fundo na reta da pista de testes. Ao fim de algumas voltas, os coreanos não se aguentam: “O que achou?”, perguntam apreensivos, num inglês carregado de sotaque. Podem ficar tranquilos, senhores. A julgar pelo que mostrou nesse breve contato, o compacto da Hyundai projetado para o Brasil tem tudo para chacoalhar o segmento mais importante do nosso mercado. A produção em Piracicaba (SP) começa em novembro.
Antes de chegar ao campo de provas, nosso grupo é levado a uma enorme sala onde nos esperava um HB branco, sem camuflagem alguma. Era a única chance de conferir o visual arrojado do hatch, pois os carros do test drive (e das fotos) estavam cobertos do capô à tampa do porta-malas. Câmeras e celulares foram recolhidos na entrada. Foto aqui, só dos carros na pista, e sem direito a imagens do interior. Mas não escondi o sorriso de satisfação ao observar que o design do hatch é igualzinho ao do mocape que o site de Autoesporte mostrou, num furo mundial, em julho de 2010 (veja aqui). Ao vivo, a impressão é ainda melhor que nas fotos-espia ou nas projeções que você confere nas próximas páginas. Os faróis grandes, os vincos marcantes e o perfil esportivo, com a parte traseira do teto mais baixa, dão ao HB um estilo agressivo que deixa o VW Gol e até o novoFiat Palio comportados.
HB da Hyundai. |
As projeções perfeitas do hatch foram confirmadas ao vermos o modelo limpo antes do test drive na pistaAbro a porta e vejo que a preocupação da Hyundai não se resumiu ao exterior. Nada de economia aparente. Em vez disso, há componentes de modelos de categoria superior. O HB exibe praticamente o mesmo (belo) quadro de instrumentos do Elantra, com direito a “copinhos” no velocímetro e no conta-giros, além de visores digitais para nível de combustível e temperatura do motor. A iluminação é azulada, padrão Hyundai. Há computador de bordo com o botão “trip” no próprio painel (à direita do velocímetro), enquanto as versões topo de linha trazem teclas de atender/desligar ligações de celular no volante, via Bluetooth. No centro, destaque para o rádio/CD player em posição elevada, ao passo que o comando da ventilação (vindo do Kia Picanto) fica mais abaixo. À frente do câmbio estão as entradas USB e auxiliar do sistema de som, com uma particularidade em relação aos demais Hyundais: elas ficam num compartimento com tampa, permitindo que você esconda seu MP3 player ou celular dos olhares de cobiça. Seria uma preocupação especial para o Brasil? Pelo sim, pelo não, agradecemos a atenção.
Seguindo no meu “tour” pelo interior, gosto da pegada do volante de três raios e de observar que ele ajusta em altura e profundidade (no crossover ix35, por exemplo, só regula em altura). Em conjunto com o banco do motorista ajustável em altura (por roldana), o recurso proporciona ótima posição para dirigir – pena que o encosto regule por alavanca. Nas laterais de porta há espaços para garrafas, como no novo Palio. Passando ao banco de trás, o encantamento diminui. O túnel que atravessa a cabine é até discreto, mas o espaço para os passageiros é apenas razoável. Com meu 1,78 m, tenho que tomar certo cuidado ao entrar, pois o teto é um pouco baixo. Mas lá dentro não bato a cabeça no teto e nem o joelho no encosto do banco da frente, também ajustado para meu tamanho. Nesse ponto, o novo Palio leva vantagem, além de ter três encostos de cabeça atrás, contra dois do HB.
Projeção do painel foi feita com base nos flagras e nos protótipos que dirigimosA Hyundai não divulgou as medidas do hatch, mas é possível fazer algumas constatações visuais: o comprimento fica em torno dos 3,90 m, enquanto a largura parece regular com a do Palio (1,67 m) e a altura está mais para oGol (1,46 m). Quanto ao porta-malas, que também não teve a capacidade revelada, me pareceu um pouco maior que nos rivais, na faixa dos 300 litros. Bom é que há poucas reentrâncias no compartimento, o que facilita o uso. Para abri-lo, a maçaneta fica embutida no vinco da tampa com o para-choque. O tanque de combustível abre por dentro, por uma alavanquinha no assoalho.
Os plásticos internos do protótipo ainda não são os finais, mas dá para perceber que a qualidade do acabamento é superior à dos concorrentes nacionais e lembra muito outros carros da marca, como o i30. O tema principal é plástico rígido, como reza a cartilha da categoria, mas com texturas e partes pintadas de cinza-escuro e prata – nas maçanetas e manopla de câmbio, por exemplo. Já o tecido dos bancos é simples, de acordo com a categoria, e a espuma tem densidade macia.
Terminada a apresentação estática, chegamos à pista de testes. Três protótipos estão à disposição: 1.0, 1.6 e 1.6 automático. A marca não fala nada sobre dados técnicos, mas indica a origem dos motores. Ambos já são usados pela Kia (que pertence ao grupo Hyundai na Coreia) no Brasil: as unidades flex do Picanto (1.0) e doSoul (1.6). Hora de acelerar.
Acerto da suspensão ainda não é o final nos modelos avaliamos; preocupação dos coreanos é com o conforto1.0
Dou a partida pela chave-canivete e logo reconheço o barulho característico do motor Kappa do Picanto. Com três cilindros, 12 válvulas (quatro por cilindro) e comando duplo variável, é um dos 1.0 mais eficientes atualmente. Um dos engenheiros no banco de trás diz que a potência é de 78 cv com etanol, número que a Hyundai não confirma oficialmente. No caso do Picanto, são 80 cv e 10,2 kgfm de torque com etanol, mas pode haver diferenças de calibragem para o HB. Os dados finais só serão revelados na época do lançamento.
Em movimento, as respostas me lembram muito as do Picanto, sinal de que a aceleração de 0 a 100 km/h deve ficar em pouco mais de 14 segundos, como conseguido pelo Kia em nossos testes. O HB 1.0 ganha velocidade com facilidade (ao menos em piso plano), e a vibração do motor (típica dos três cilindros) é atenuada com um bom trabalho dos coxins – só é preciso se acostumar com uma ligeira vibração na marcha lenta. O motor gira suave em altas rotações e o barulho não chega a incomodar, mesmo a 4.000 rpm, quando o velocímetro aponta 120 km/h em quinta marcha. Como no Picanto, o consumo deverá ser uma das atrações do HB, fruto do cilindro a menos. Baseado nas marcas registradas pelo Kia em nossas medições, com etanol, é possível prever cerca de 9,5 km/l na cidade e 14 km/l na estrada. Antes de trocar para o 1.6, vale destacar a atuação do câmbio. De engates fáceis e curtinhos, lembra o do Gol.
Com motores modernos, o HB mostrou bom desempenho na pista de Namyang1.6
Com o motor Gamma 1.6 16V, o HB exibe acelerações bastante animadas, quase esportivas. Numa saída mais forte, chego aos 150 km/h rapidamente, mostrando que fôlego não falta ao propulsor, especialmente em rotações elevadas. Se esse 1.6 fica bom no Soul, então imagine num carro mais leve? Pois é. No Kia, a potência chega a 130 cv e o torque alcança 16,5 kgfm, mas, novamente, isso não significa que os valores do HB sejam exatamente os mesmos – uma fonte da Hyundai declarou 125 cv com etanol, mas a marca não atesta o dado. A relação de transmissão nos pareceu acertada, com 3.400 rpm a 120 km/h em quinta marcha. Em altas rotações, porém, o isolamento acústico não foi capaz de impedir que o ruído do motor invadisse a cabine com mais vontade. O câmbio é tão bom quanto o da versão 1.0.
1.6 Automático
Aqui, os ânimos do bom motor 1.6 16V são um pouco arrefecidos pelo câmbio de apenas quatro marchas – é a antiga caixa usada por Soul e Cerato, que agora ganharam câmbio de seis velocidades. As trocas de marcha são suaves, mas há certa indecisão nas retomadas, o que causa perda de rendimento nas ultrapassagens e subidas. Ainda assim, a boa força do propulsor proporciona desempenho agradável. E a concorrência não oferece nada além dos automáticos de quatro marchas (Renault Sandero, Peugeot 207 e Citroën C3) ou automatizado de cinco velocidades (Gol, Palio e Fox). Ou seja, se o HB não tem o câmbio mais moderno (poderia, se fosse o de seis marchas), estará ao menos bem inserido na briga.
Em todas as versões, um dos itens que tem dado mais trabalho à engenharia é a suspensão – tanto que os protótipos avaliados ainda não estavam com o acerto final de molas e amortecedores. “Lá no Brasil vocês valorizam dirigibilidade ou conforto?”, me pergunta um dos engenheiros. Digo que prefiro o handling, mas que o brasileiro gosta de carro que passa suave por nossas ruas esburacadas. Ele concorda. Por isso, o HB tem rodar mais macio que o dos demais Hyundais, embora, quando forçado em curvas ou desvios rápidos, tenha mostrado pouca rolagem da carroceria. A suspensão usa o mesmo esquema dos rivais, McPherson na frente e eixo de torção atrás. Comparando, o HB fica no meio-termo entre a maciez do Palio e a firmeza do Gol.
A versão 1.0 exibiu acelerações adequadas ao piso plano, enquanto a 1.6 se revelou quase esportivaSó achei que os pneus são altos demais (175/70 R14), novamente pelo temor dos coreanos diante da má qualidade do asfalto brasileiro. Ao entrar mais “quente” no retorno da pista, os pneus dobravam em demasia, prejudicando a estabilidade. Um jogo de medidas 175/65 certamente ajudaria nessa condição, sem prejudicar tanto o conforto. Aliás, interessante observar que os pneus dos protótipos eram brasileiros, das marcas Pirelli eGoodyear, em vez dos tradicionais coreanos Kumho e Hankook. Mas, como dissemos, o conjunto suspensão/pneus é uma equação que ainda falta para a Hyundai resolver até o carro que vai para as lojas. O que já está definido é a direção hidráulica, que exibe leveza nas manobras, chegando a lembrar um sistema elétrico.
Entro de volta no ônibus que nos levaria a Seul convencido de que a Hyundai vai mexer com o segmento de carros compactos. No caminho até a saída do centro de desenvolvimento, um Fiat Uno Way rodando por lá mostra que os coreanos estão estudando a fundo os concorrentes – há notícias de que Gol, 207, Sandero e Honda Fit também foram dissecados pelos engenheiros coreanos. A questão-chave para o sucesso do HB será mesmo o preço: se mantiver a previsão de valores a partir dos R$ 30 mil na versão 1.0, R$ 38 mil na 1.6 e R$ 43 mil na 1.6 automática, tem tudo para escoar a produção de 150 mil carros/ano. Os problemas que hoje afetam os importados da marca, como a falta de peças e os preços flutuantes (de acordo com a procura) da importadora Caoa prometem ser resolvidos com a fábrica local, de capital 100% Hyundai. Fora isso, o hatch deve chegar com a longínqua garantia de cinco anos dos demais modelos da marca. Somados todos os fatores, a partir de novembro, a vida de Gol e Palio (sem falar nos demais compactos) tende a nunca mais ser a mesma.
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